Autor: Siomar J. Zachesky
Trabalho apresentado ao Curso de Direito Processual Civil
(todos os direitos reservados - quem utilizar citar a fonte)
PROVA TESTEMUNHAL
1. Conceito
A prova testemunhal é, sem dúvida, o mais antigo meio probatório. No
entanto, por estar sujeita a imprecisões, inconfiabilidade e imparcialidade da
fonte, bem como pela falha natural da capacidade de memória do ser humano, que
ao não lembrar com exatidão dos fatos, pode vir a inserir nos autos processuais
o que “acha” e não o que realmente sabe, viu ou ouviu. Por tudo isso já foi titulada,
de forma pejorativa, como sendo “a prostituta das provas”.
Contudo, é o meio probatório que se pode obter da forma mais
simples, porém, não tão eficaz, todavia, não rara às vezes, se apresenta como o
único meio de prova. A testemunha arrolada, não sendo parte no processo, ao
prestar o compromisso legal, e, diante do juiz e das partes, transmite de forma
verbal ou escrita os fatos passados de que tem conhecimento, auxiliando assim o
magistrado a formar o seu convencimento sobre o litígo.
Assim, João Monteiro ao conceituar o que seria a testemunha,
define-a como “a pessoa, capaz e estranha ao feito, chamada a juízo para depor
o que sabe sobre o fato litigioso”. Já no dizer de Paula Batista, testemunha
nada mais é do que “as pessoas que vêm a juízo depor sobre o fato
controvertido”. (Theodoro Junior, p. 418)
2. Requisitos
A testemunha não se confunde com a parte, sendo pessoa física
dotada de capacidade, poderá servir aos interesses da justiça, na busca da
verdade real ou a alcançável. Mas para que o valor probante da testemunha possa
surtir seus efeitos legais, se faz necessário que a mesma não seja impedida ou
suspeita, bem como não tenha interesse pessoal sobre o litigio.
Há que se ressaltar que a capacidade para ser testemunha, não se
confunde com a capacidade civil. Pois, mesmo a pessoa dotada de toda a capacidade
civil, para assumir direitos e obrigações, sendo, no entanto, portadora de
deficiências físicas, como: cegueira, surdez, ou outra enfermidade que lhe
dificulte a memória, por exemplo, fica impossibilitada de testemunhar por
absoluta eneficácia do meio probatório.
Porém, o maior de dezesseis anos e menor de dezoito, poderá ser
arrolado como testemunha, contudo, por ser inimputável não incorrerá em crime
de falso testemunho se mentir em juízo. Todavia, o menor absolutamente incapaz,
pode em determinadas situações ser ouvido como informante, principalmente na
esfera do direito de família, mas o valor probatório, sem dúvidas, não terá o
mesmo efeito do valor testemunhal.
2.1 Quanto à suspeição
O § 3º do art. 405 do CPC, relaciona as pessoas que podem ser
consideradas suspeitas e, consequentemente, não poderão figurar no processo como
testemunha.
São elas:
a) as pessoas condenadas, desde que em sentença transitada em
julgado. Porém, havendo reabilitação e, assim, desaparecendo os efeitos da
condenação, ou ainda a extinção da punibilidade, tal restrição desaparece.
b) o que, por seus costumes, não for digno de fé. Muitos
doutrinadores, entre eles Luiz R. Wambier criticam tal disposivo, por conter aquilo
que a própria CF combate, o preconceito e a discriminação.
c) o inimigo capital da parte, ou o seu amigo íntimo. Aqui se
utiliza os mesmos critérios do art. 135, I, que trata da suspeição do juiz.
Certamente a testemunha que possuir umas destas relações com a parte, tornará
viciada a prova testemunhal.
d) o que tiver interesse no litígio. A testemunha, conforme já
definido, é toda a pessoa que vem a juízo relatar o seu conhecimento a respeito
dos fatos, sem que haja interesse próprio, sendo imparcial e estranha à lide.
Assim, aquele interessado no resultado da demanda judicial, não poderá figurar
como testemunha.
2.2 Impedimento
Já o impedimento ocorre por uma falta ou motivo mais grave que os
de suspeição, pois são situações que podem ser verificadas de imediato, e o
Código Civil aduz tais situações no art. 405, §2º, incisos I,II e III. Assim,
são impedidos:
a) o cônjuge e os parentes colaterais, até o terceiro grau, das
partes. Porém, há exceção quando inexiste outro meio de se provar os fatos, bem
como, quando houver interesse público ou, ainda, quando dispuser sobre os
estados das pessoas. Todavia, há jurisprudência no sentido de aceitar tais
meios probatórios, mesmo se tratando de testemunhas impedidas, quando as causas
versarem sobre direito de família, pois aqui, nada melhor que os próprios
integrantes do núcleo familiar para falarem sobre os fatos.
b) o inciso II, do art. 405, § 2º, do CPC, dispõe, que aquele que é
parte na causa não poderá figurar como testemunha, obviamente, pelo interesse
que tem sobre o litígio.
c) Também são impedidos aqueles que intervêm em nome da parte, no
processo. Ou seja, o tutor, o curador, o mandatário, juíz ou advogado, e até
mesmo outros que tenham assistido a parte. Quando a Lei estabelece que o juiz
não possa ser arrolado como testemunha, tão somente, refere-se ao juiz que
atuou ou está atuando no devido processo. Pois qualquer juiz pode ser
testemunha num processo, desde que não seja ou esteja impedido, ou ainda, se
este tiver conhecimento dos fatos e se declarar impedido, passará a causa para
o seu substituto e testemunhará, conforme disposição legal do art. 134,II,
parte final.
Assim, os pressupostos de suspeição e impedimento não são absolutos.
Pois tais hipóteses são perfeitamente possíveis, como nos casos acima citados.
Porém estes não prestam o compromisso legal de dizer a verdade, e assim, há que
se analisar, com reservas, o conteúdo do depoimento.
2.3 Classificação
As testemunhas podem ser classificadas da seguinte forma:
I) presenciais: como o próprio nome já descreve, são aquelas que,
por terem contato direto com o fato, possuem maior credibilidade.
II) de ouvida: também classificada como “de referência”, estas não
presenciaram diretamente os fatos que iram narrar, mas deles, tão somente
ouviram falar.
III) referidas: são as testemunhas que foram citadas por outras,
durante a oitiva destas. Assim, podem ser arroladas de ofício ou por interesse
da parte, a fim de que sejam ouvidas.
3. Da fundamentação e admissibilidade
da prova testemunhal
O Códido de Processo Civil, na seção VI, dispõe sobre a prova
testemunhal e, na subseção I, da admissibilidade e do valor da prova
testemunhal. O Art. 400, e ss, do aludido Código, até o Art. 419, trata de toda
a matéria relacionada a este meio de provas. Vale destacar aqui alguns dos
artigos do citado Código, para que se tenha uma noção exata da admissibilidade
destas no processo.
Art. 400. A
prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso. O
juiz indeferirá a inquirição de testemunhas sobre fatos:
I - já provados por documento ou confissão da parte;
II - que só por documento ou por exame pericial puderem ser provados.
Nota-se por este texto legal, que não
há disposição contrária a apresentação de prova testemunhal, sendo a mesma,
admissível sempre. No entanto, poderá o magistrado indeferir a inquirição de
testemunhas que sejam desnecessárias ou irrelevantes ao processo, devido a
fatos já provados por documentos e até mesmo pela confissão da parte, e ainda
que somente através de documentos e por exames periciais puderem ser provados.
Quanto à prova exclusivamente
testemunhal, ao contrário do artigo anterior, esta somente será admitida nas
relações contratuais com valores não excedentes a dez vezes o maior salário
mínimo à época da celebração do contrato, conforme preceitua o Art. 401 CPC.
Bem como em contratos de qualquer valor, mas que por motivos de ordem moral ou
material, não se pôde obter a prova escrita da obrigação, como nos casos de
parentesco, depósito necessário e hospedagem em hotel. E ainda, nos casos em
que houve o início de uma prova por escrito emanada da parte ré, com isso
tentando através de testemunha provar o fato. (Art. 402, incisos I e II)
É também lícita a prova testemunhal, à
parte inocente, quando se pretende provar que a vontade real diverge da vontade
declarada, nos contratos simulados. (contrato com finalidade diversa daquela
mencionada), ou ainda, nos contratos em geral quando ocorrerem vícios de
consentimento. (Art. 404, incisos I e II)
4. Obrigações e direitos
da testemunha
Mesmo a doutrina lecionando que, uma
vez intimada, a testemunha tem o dever cívico de comparecer em juízo e dizer a
verdade, caso esta não compareça sem justificatica, poderá ser coagida a fazê-lo,
e ainda sofrerá o ônus desse descumprimento.
Uma vez intimada, deverá comparecer.
Contudo, dispensada a intimação pela parte, com o compromisso desta de levá-la
á audiência, não ensejará condução coercitiva. Os militares, bem como os demais
funcionários públicos, deverão ser requisitados a seus superiores.
É dever da testemunha, colaborar com a
justiça respondendo o que lhe for perguntado. O art.406 menciona as situações em
que esta não é obrigada a falar.
Sobre fatos:
I - que
Ihe acarretem grave dano, bem como ao seu cônjuge e aos seus parentes
consangüíneos ou afins, em linha reta, ou na colateral em segundo grau;II - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo.
Assim, a testemunha que comparecer em juízo, prestar
depoimento e dizer a verdade, estará cumprindo o dever cívico de colaborar com
a justiça. No entando, depoimentos falsos ou mentirosos, podem acarretar sérios
problemas, pois ao prestar o compromisso legal, pode até ficar silente, jamais
mentir. Para conter excessos ou abusos, há a previsão legal no art. 342 do CP,
do crime de falso testemunho.
Em relação aos direitos das
testemunhas, estas somente poderão ser questionadas pelo magistrado e, de forma
indireta, pelos advogados, ou seja, os questionamentos serão dirigidos ao juiz,
que por sua vez, reproduzirá às mesmas.
Também não poderá sofrer qualquer tipo
de constrangimento ou coação, aquele ou aquela que estiver sendo interrogada na
qualidade de testemunha. O respeito e a cortesia devem fazer parte do ato
interrogatório. Perguntas de cunho vexatório ou constragedor devem ser
evitadas, caso aconteça, pode a mesma se negar a responder.
As pessoas que forem intimadas a
comparecer, a fim de prestarem depoimento em juízo como testemunhas, ficaram
isentas de descontos em sua folha de pagamento, haja vista estarem prestando
serviço público, e ainda terão direito ao ressarcimento das despesas sofridas, pela
parte que as arrolou.
5. Procedimento da prova
testemunhal
Há procedimento legal a ser obedecido,
quanto ao momento em que se deve
requerer a realização de prova testemunal. O art. 282, VI, e 300 do CPC,
estabelece esse momento, que será ainda na fase postulatória através da petição
inicial. No processo sumário o rol de testemunhas, do autor, deve vir expresso
na inicial, e as do réu na contestação, não havendo outro momento para fazê-lo,
precluindo tal direito.
No entanto, se a matéria versar sobre
direito disponível, o Código de Processo Civil estabelece que, não havendo
conciliação, o juiz fixará os pontos controvertidos, decidirá as questões
processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, ou seja, na
audiência preliminar (art. 331 CPC). Os casos que não se enquadrarem nesse
dispositivo serão oportunizados na fase saneadora do processo.
Todavia, como no Direito sempre há
exceções, aqui também não seria diferente, pois o juiz pode determinar de
ofício a intimação de uma testemunha, desde que nos autos processuais contenham
indícios relevantes de que esta é indispensável na busca da verdade real, ou a
mais próxima desta, a alcançável. Pode ainda a parte, se pretender, requerer a
ouvida de testemunhas residentes fora da comarca e até mesmo em outros países,
através de carta precatória, rogatória ou de ordem.
Vale ressaltar que o número máximo de testemunhas não deverá ultrapassar
a dez, podendo o juiz, no entanto, dispensar aquelas que se destinem a provar
os mesmos fatos, aproveitando destas, apenas très.
Depois de apresentado o rol de
testemunhas, não se admite substituição, excepcionalmente nos casos
especificados em lei: falecimento, enfermidade que impossibilite seu
depoimento, ou mudança de endereço, quando este é incerto ou desconhecido.
A norma procedimental processual determina
que seja na audiência de instrução e julgamento a colheita da prova
testemunhal, mais precisamente, após os esclarecimentos do expert e, após serão tomadas as declarações pessoais. A exceção é a
antecipação do depoimento quando foi colhido por carta, ou ainda, quando por
enfermidade, tal depoimento tiver de ser colhido em outro local. Há ainda
aqueles que por prerrogativa de função não depõem na audiência (art. 411).
O art. 413 estabelece a ordem a ser
seguida à colheida das provas testemunhais. Primeiro ouvem-se os depoimentos
das testemunhas arroladas pelo autor, em seguida as do réu, nessa ordem. Cada
testemunha é ouvida na presença do juiz e do representante do MP, quando houver
necessidade, bem como dos advogados, de modo que as demais testemunhas não
tenham acesso ao depoimento, para que não sejam influenciadas.
Ao iniciar a sessão, o magistrado
qualificará a testemunha na forma da lei, bem como questionará a mesma, se há
impedimento, suspeição ou incapacidade que a impossibilite de testemunhar.
Surge então, nesse momento, a oportunidade à parte ré, de contraditar a
testemunha quanto a sua afirmação de não haver nenhum impedimento. Havendo, o
juiz decidirá essa questão incidental, dentro da mesma audiência.
Não havendo qualquer das hipóteses de
suspeição, incapacidade ou impedimento, o magistrado iniciará a tomada do
depoimento, antes, porém, lembrará a testemunha do dever de dizer a verdade,
nada além da verdade. Deve ainda, informá-la, como já dito anteriormente, do
crime de falso testemunho, caso assim o faça. Isto posto, o juiz inquirirá a
testemunha sobre os fatos constantes nos autos dos quais esta tem conhecimento.
Feito isso, passará a palavra aos procuradores das partes, primeiramente ao do
autor, posteriormente, o da parte contrária.
Todo o conteúdo da audiência será ditado
pelo juiz e registrado pelo escrivão, formando um termo, que ao final será
subscrito por todos, juiz, depoente e advogados. No sistema atual, eletrônico,
a audiência é gravada e desta é elaborada uma ata da audiência com o resumo de
tudo o que ocorreu, e as partes, se desejarem, terão acesso a tudo, cabendo às
mesmas a degravação se necessitarem.
O Art. 417 foi alterado pela Lei
11.419/06, que disciplina o processo eletrônico, e traz nova redação ao art.
169 do CPC, incluindo os §§ 2º e 3º, a saber:
Art. 169. Os
atos e termos do processo serão datilografados ou escritos com tinta escura e
indelével, assinando-os as pessoas que neles intervieram. Quando estas não
puderem ou não quiserem firmá-los, o escrivão certificará, nos autos, a
ocorrência.
§ 2º Quando se tratar de processo total ou parcialmente
eletrônico, os atos processuais praticados na presença do juiz poderão ser
produzidos e armazenados de modo integralmente digital em arquivo eletrônico
inviolável, na forma da lei, mediante registro em termo que será assinado
digitalmente pelo juiz e pelo escrivão ou chefe de secretaria, bem como pelos
advogados das partes.
§ 3º No caso do § 2o deste artigo, eventuais contradições
na transcrição deverão ser suscitadas oralmente no momento da realização do
ato, sob pena de preclusão, devendo o juiz decidir de plano, registrando-se a
alegação e a decisão no termo. (CPC)
O juiz que preside a
audiência, não permitirá questionamentos de cunho subjetivo, bem como aqueles
que envolvam opinião própria, pois aqui, o objetivo é a busca de elementos
probatórios e não de fatos intuitivos, presumidos, que façam juízo de valor.
Ainda, durante a sua ouvida, é defeso à testemunha ou à parte, levarem seus
depoimentos já escritos, para não esquecerem, pois a colheita de provas é ato
vebalizado e espontâneo.
Outra questão de acentuada
importância é a que se refere às testemunhas de nacionalidade estrangeira que
desconhecem o idioma pátrio, estas não serão impedidas de prestarem depoimento.
O juiz deverá, de acordo com o art. 151, II e III, nomear intérprete para
estes, bem como intérprete conhecedor de LIBRAS, para o surdo-mudo, analfabeto,
tudo isso reduzido a termo.
5.1 Acareação
É o confronto, que tem a
finalidade de sanar dúvidas, entre as testemunhas, ou entre testemunhas e
partes que prestaram depoimentos divergentes. Vale ressaltar que é inadmissível
a acareação entre as partes. O juiz de ofício ou a requerimento, pode
determinar a acareção para dirimir as controvérsias, dúvidas existentes.
Observando o magistrado que houve testemunho falso, mentiroso, ou ainda a falsa
imputação de crime, deverá extrair cópias das mesmas e remetê-las ao Ministério
público para que sejam tomadas as devidas providências.
Porém, a acareação somente
será admitida, se os pontos conflitantes dos depoimentos dificultarem, ainda
mais, a decisão do juiz julgador. A acareação será realizada na mesma
audiência, por isso, não serão dispensadas as testemunhas até que o juiz assim
ordene, ou seja, dê por encerrada a audiência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
THEODORO JÚNIOR,
Humberto. Curso de Direito Processua Civil: Teoria Geral do Direito Processual
Civil e Processo de Conhecimento. 38.
ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2005.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flavio Renato
Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de
processo civil. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007.
v. 2.
BRASIL. Código
de Processo Civil. Vade Mecum: Acadêmico de Direito. 12ª ed. São Paulo. Ed.
Rideel, 2011.
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